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Novo estudo aponta desafios e soluções para a redução de emissões de CO2 no Brasil
Um novo estudo publicado na revista Perspectives in Ecology and Conservation destaca os desafios críticos que o Brasil enfrenta para reduzir as emissões de carbono por mudanças no uso e cobertura da terra - principal fonte de emissões do país. O Brasil é um dos mais de 190 países signatários do Acordo de Paris, um compromisso promovido pelas Nações Unidas que tem como objetivo conter o aumento da temperatura média global para menos de 2ºC acima dos níveis pré-industriais. Este compromisso estabelece que os países definam metas de redução de suas emissões de carbono até 2030. O Brasil se comprometeu a reduzir suas emissões em 53% até 2030, em comparação com os níveis de 2005. Apesar desta meta, as emissões de CO2 líquidas por mudanças no uso e cobertura da terra dobraram entre 2017 a 2022, de acordo com o levantamento do Sistema de Estimativa de Emissão de Gases de Efeito Estufa (SEEG). No estudo recém-publicado, desenvolvido por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (CEMADEN), os autores apresentam um panorama do desmatamento e restauração da vegetação nativa nos biomas brasileiros e também apontam estratégias para a redução das emissões de carbono.
Principais desafios:
● Aumento do desmatamento: A remoção de vegetação nativa no Brasil vem aumentando desde 2017, atingindo taxas próximas ou superiores a 2 milhões de hectares ao ano, quando se considera o desmatamento em todos os biomas. Em 2022 foram 2,8 milhões de hectares desmatados, a maior taxa desde 2008. As altas taxas foram impulsionadas principalmente pelo aumento do desmatamento na Amazônia e Cerrado, que são responsáveis por mais de 70% do total desmatado. Junto com o aumento do desmatamento, também ocorre um aumento da degradação das florestas remanescentes, seja por estarem mais expostas aos incêndios florestais ou devido à maior mortalidade de árvores nas bordas dos fragmentos. Consequentemente, a degradação também promove um aumento das emissões de carbono.
● Deficiências na Restauração: Com base nas informações do Panorama do Código Florestal, elaborado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), há um déficit de 15,8 milhões de hectares em áreas de Reserva Legal em propriedades rurais que precisam de restauração da vegetação nativa. Deste total, mais da metade está na Amazônia e outros 25% no Cerrado. Nas Áreas de Preservação Permanente (APPs), outra porção das propriedades rurais que precisa de proteção e se encontra por exemplo nas margens dos rios e nascentes, o déficit de restauração chega a 3 milhões de hectares, com um terço deste total na Amazônia e outro um terço na Mata Atlântica.
● Crescimento sem proteção das florestas secundárias: Em 2016, o Brasil se comprometeu a restaurar 12 milhões de hectares de florestas nativas até 2030 como parte das suas contribuições para o Acordo de Paris. A restauração de florestas é uma ferramenta importante nesse sentido, pois as florestas secundárias, aquelas que crescem após a remoção da cobertura florestal original, têm alta capacidade de sequestrar carbono da atmosfera. O estudo identificou que, entre 2017 e 2022, 5,46 milhões de hectares de florestas secundárias cresceram no Brasil, com 40% desse
crescimento ocorrendo na Amazônia e 36% na Mata Atlântica. Apesar de o total de ganhos ser quase metade do que foi almejado pelo governo até 2030, o estudo aponta que as florestas secundárias no Brasil não possuem legislação adequada para protegê-las contra o desmatamento e garantir seu potencial de mitigação de carbono a longo prazo.
● Desmatamento legal como obstáculo para a redução de emissões: De acordo com o Panorama do Código Florestal, há aproximadamente 78 milhões de hectares de vegetação nativa passíveis de serem desmatadas legalmente no Brasil. Estas áreas se enquadram como excedente de vegetação nativa em propriedades rurais em que a cobertura da vegetação é maior do que os percentuais estabelecidos pelo Código Florestal. É no Cerrado e na Caatinga que se encontram a maior parte destas áreas, com 38% e 23% do total, respectivamente. Além disso, a área passível de desmatamento legal é seis vezes maior que os 12 milhões de hectares almejados pelo governo para serem restaurados, o que inviabilizaria a longo prazo toda a compensação de emissões das florestas restauradas.
Figura: Estratégias para a redução das emissões de Carbono no Brasil (Fonte: Infográfico do Artigo - link mais abaixo)
Caminhos para melhorar a governança ambiental:
Como o sexto maior emissor de CO2 no mundo, o Brasil desempenha um papel crucial nos esforços globais para combater as mudanças climáticas. No entanto, o estudo aponta que a governança ambiental tem enfraquecido nos últimos anos em relação à proteção das florestas, levando a um aumento das atividades ilegais de corte e queima da vegetação e das emissões de carbono. Para alinhar-se aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e ao Acordo de Paris até 2030, os autores sugerem medidas urgentes, incluindo:
● Combate ao Desmatamento Ilegal: Fortalecimento da legislação, responsabilização e maior fiscalização para prevenir o desmatamento ilegal e a degradação florestal.
● Programas de Restauração em Grande Escala: Implementação de programas robustos para restaurar áreas de vegetação nativa.
● Incentivos Econômicos: Criação de incentivos financeiros para proprietários rurais que conservam a vegetação nativa através de pagamentos por serviços ambientais.
A implementação eficaz dessas estratégias é essencial para atingir as metas de redução de emissões de CO2 até 2030 e contribuir significativamente para os esforços globais de mitigação das mudanças climáticas. Para Débora Dutra, doutoranda no INPE e líder do estudo, “é necessário fortalecer a legislação ambiental e aumentar a fiscalização para combater o desmatamento ilegal e a degradação florestal, além de incentivar a criação e permanência de programas de restauração em grande escala para reduzir as emissões de carbono no Brasil”. Tais ações são importantes não apenas para proteger a biodiversidade dos biomas brasileiros, mas também para assegurar um futuro sustentável para as próximas gerações.
Para mais informações, acesse o estudo completo em ScienceDirect.
Ciência se faz com colaboração:
● Débora Joana Dutra : doutoranda do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
● Marcus Vinicius de Freitas Silveira: doutorando do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
● Guilherme Mataveli: pesquisador de pós-doutorado no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
● Poliana Domingos Ferro: doutoranda do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
● Deila da Silva Magalhães: doutoranda do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
● Thaís Pereira de Medeiros: doutoranda do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
● Liana Oighenstein Anderson: pesquisadora do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de
Desastres Naturais
● Luiz Eduardo Oliveira e Cruz de Aragão: pesquisador no Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais