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Planejamento sustentável do uso da terra pode salvar a Amazônia do aumento de incêndios relacionados às mudanças climáticas até o final do século 21

Um estudo publicado hoje na prestigiada revista Global Change Biology e liderado por cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e do Centro de Pesquisa e Monitoramento de Desastres (CEMADEN) no Brasil com a colaboração de pesquisadores da Universidade de Exeter - Reino Unido e da Universidade de Estocolmo - Suécia, destaca que o manejo ...
publicado: 15/07/2019 14h38 última modificação: 06/02/2020 09h53

Um estudo publicado hoje na prestigiada revista Global Change Biology e liderado por cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e do Centro de Pesquisa e Monitoramento de Desastres (CEMADEN) no Brasil com a colaboração de pesquisadores da Universidade de Exeter - Reino Unido e da Universidade de Estocolmo - Suécia, destaca que o manejo sustentável do uso e cobertura da terra pode ser a principal solução para minimizar drasticamente a extensa degradação das florestas amazônicas pelo aumento do risco de incêndios florestais causados pelas mudanças climáticas.

O estudo, intitulado "Efeitos de cenários de mudanças climáticas e de uso do solo na probabilidade de fogo durante o século 21 na Amazônia brasileira" (Effects of climate and land-use change scenarios on fire probability during the 21st century in the Brazilian Amazon), quantificou que na Amazônia brasileira futuras conversões de floresta para usos agropastoris não manejados adequadamente podem causar um aumento de mais de 70% na extensão de áreas com alta probabilidade de fogo no final deste século em relação aos padrões observados. Este cenário inclui, por exemplo, a redução da efetividade das áreas protegidas, a pavimentação de novas rodovias e o aumento do desmatamento. Quando combinado com o cenário pessimista de mudança climática do CMIP5 do IPCC, que projeta maiores emissões de gases de efeito estufa (GEE) ao longo do século 21, a área com alta probabilidade de incêndios poderia aumentar em até 110%.

Marisa Fonseca, pesquisadora de pós-doutorado do INPE e principal autora do estudo, afirma: “Esses números são preocupantes porque, embora essa projeção seja feita assumindo uma taxa de desmatamento superior à atual, segundo o monitoramento anual realizado pelo PRODES/INPE, entre 2012 e 2018 houve um aumento de 65% na taxa de desmatamento”.

Segundo os dados de alerta do projeto DETER/INPE, entre julho de 2018 e julho de 2019, 5.364 km2 de florestas foram desmatadas e outros 4.405 km2 foram afetados por incêndios florestais. “Isso significa que, se continuarmos removendo a cobertura florestal na Amazônia, estaremos potencializando a probabilidade de degradação das florestas remanescentes, com consequências para a estabilidade dos estoques de carbono e serviços ambientais”, acrescenta Fonseca.

Unidades de conservação e terras indígenas também não parecem estar seguras. Os resultados do modelo indicam que mais de 1 milhão de km2 dentro das terras indígenas ou áreas protegidas estariam sujeitas a uma maior probabilidade de ocorrência de incêndios florestais, ameaçando tanto os ecossistemas quanto as populações humanas nessas áreas. A adoção de medidas destinadas a reduzir o desmatamento e as emissões de GEE, no entanto, pode reduzir significativamente a probabilidade de incêndios florestais, mesmo com a intensificação das secas na Amazônia no final do século.

Usando uma combinação mais otimista de mudanças climáticas e cenários de uso da terra, que considera o cumprimento da legislação ambiental, o Código Florestal Brasileiro, a proteção de unidades de conservação e a redução do desmatamento para taxas anuais abaixo de 1000 km2 até 2025, reduzindo, assim, as taxas de emissões de GEE, com posterior estabilização na segunda metade do século, o aumento da área com alta probabilidade de incêndio seria 90% menor que no cenário anterior. Para alcançar o nível de mudanças considerado no cenário otimista usado neste estudo, um esforço coordenado pela sociedade civil, governo e especialistas é fundamental, dizem os pesquisadores. "No CEMADEN, estamos desenvolvendo um sistema de monitoramento de incêndios florestais que permite a identificação de propriedades onde há incêndios, fortalecendo as relações com instituições locais e trabalhando com comunidades e escolas no Estado do Acre. Essas ações são a base para reduzir o risco de incêndios e seus impactos. No futuro, pretendemos expandir esse sistema para outros estados da Amazônia ", afirma Liana Anderson, pesquisadora do centro e co-autora do estudo.

Apesar dos resultados alarmantes deste estudo, Luiz Aragão, investigador principal da pesquisa e chefe da Divisão de Sensoriamento Remoto do INPE, vê os resultados com grande otimismo. O pesquisador afirma que "o estudo identifica um problema muito sério e temos que usar este resultado em benefício do desenvolvimento sustentável do Brasil. Os resultados de Fonseca et al. destacam ameaças potenciais à estabilidade dos ecossistemas amazônicos".

Aragão explica que: "pela primeira vez conseguimos demonstrar que, embora o clima esteja mudando, com a possibilidade de consequências negativas para a Amazônia, o maior vilão na questão das queimadas é o uso mal planejado da terra nessa região.  A lição é que, ao contrário do clima, os problemas relacionados ao uso da terra podem ser resolvidos através de medidas de controle que podem ser implementadas rapidamente, resolvendo uma fração significativa do problema.  A produção energética no Brasil é centrada em energia hidrelétrica. Além disso, grande parte da economia brasileira é baseada em produtos biológicos, derivados de plantas e animais. Para manter a balança comercial brasileira positiva, há a necessidade de garantir a exportação desses produtos. Para promover o desenvolvimento nacional, portanto, a sociedade e os governos tem que entender que precisamos da floresta Amazônica com sua plena extensão e funcionamento para garantir, dentre outros serviços essenciais, o provimento de chuva para a produção agrícola e para o abastecimento das bacias hidrográficas”, conclui Aragão.

A Global Change Biology está classificada em 1º lugar entre os periódicos na área de Conservação da Biodiversidade e em 2º lugar na área de Mudanças Globais e Planetárias. O estudo pode ser acessado através da página da revista no link https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/gcb.14709